Como referenciar este texto: Cuidado e solidariedade no Ensino Infantil: práticas para EI02EO01. Rodrigo Terra. Publicado em: 18/12/2025. Link da postagem: https://www.makerzine.com.br/educacao/cuidado-e-solidariedade-no-ensino-infantil-praticas-para-ei02eo01/.
Apresentamos estratégias de mediação docente, sequências didáticas curtas e formas de registro e avaliação formativa que respeitam a rotina da criança e favorecem a construção de atitudes solidárias.
O material privilegia ações de baixo custo, possibilidade de adaptação às diferentes realidades escolares e articulação com famílias e comunidade. Cada subseção traz pistas práticas para serem desenvolvidas e ampliadas no cotidiano pedagógico.
Base legal e conceitual (BNCC EI02EO01)
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) orienta que a formação inicial e continuada para a Educação Infantil deve articular direitos de aprendizagem com práticas afetivas e éticas. O indicador EI02EO01 insere-se nesse quadro ao exigir que as crianças desenvolvam atitudes de cuidado e solidariedade nas interações cotidianas, o que tem respaldo em marcos legais como a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente, além de princípios internacionais sobre os direitos da criança. Essa fundamentação garante que as práticas pedagógicas promovam acolhimento, proteção e respeito à diversidade desde os primeiros anos.
Conceitualmente, é importante distinguir cuidado — práticas de proteção, atenção às necessidades básicas e garantia de segurança — de solidariedade, que envolve empatia, cooperação e ações voltadas ao bem-estar coletivo. Trabalhar esses conceitos na etapa EI implica ampliar a compreensão das crianças sobre interdependência social, desenvolver linguagem emocional e cultivar habilidades sociais como compartilhar, oferecer ajuda e negociar conflitos com mediação adulta. Tais aprendizagens são tanto afetivas quanto éticas, contribuindo para a formação de sujeitos mais atentos ao outro.
Na perspectiva pedagógica, a base legal e conceitual orienta a organização do ambiente, a seleção de materiais e as rotinas que favorecem interações solidárias: cantos de convivência, projetos de cuidado de plantas e animais, rodas de conversa sobre sentimentos, e jogos cooperativos são exemplos práticos. O papel do docente é mediar experiências, modelar comportamentos e propor desafios que estimulem a autonomia responsável e o reconhecimento das necessidades alheias. A articulação com famílias e comunidade amplia o alcance dessas práticas, tornando-as consistentes e contextualizadas.
Finalmente, a avaliação formativa alinhada ao EI02EO01 privilegia registros qualitativos — observações, narrativas, fotos de interações e portfólios — que documentam progressos nas atitudes de cuidado e solidariedade. Esses registros servem para ajustar intervenções, planejar sequências didáticas e dialogar com responsáveis sobre objetivos e avanços. Ao ancorar práticas na base legal e nos conceitos fundamentais, as escolas fortalecem ambientes inclusivos e seguros, onde as atitudes solidárias são cultivadas como parte da rotina e do projeto pedagógico.
Competências e objetivos para a etapa
Competências centrais: Nesta etapa, a competência a ser enfatizada envolve a construção de atitudes de cuidado e solidariedade nas interações diárias. Isso inclui fomentar empatia, respeito às diferenças, senso de responsabilidade pelos colegas e pelos espaços coletivos, além de promover vínculo afetivo seguro entre crianças e adultos. A atuação docente deve articular o desenvolvimento socioemocional com rotinas previsíveis que permitam às crianças experimentar e consolidar comportamentos solidários.
Objetivos de aprendizagens específicos: Espera‑se que as crianças consigam identificar e nomear emoções simples, oferecer ajuda espontânea a pares, partilhar materiais e negociar regras de convívio em situações de jogo. Outros objetivos incluem a adoção de práticas de cuidado com o próprio corpo e com o ambiente (higiene, organização dos brinquedos), e a capacidade de resolver pequenos conflitos por meio de diálogo mediado pelo professor.
Práticas pedagógicas sugeridas: Organize o espaço e a rotina para favorecer interações colaborativas: cantos cooperativos, tarefas em duplas ou grupos pequenos, rodas de conversa sobre sentimentos e leituras que abordem solidariedade. Use dramatizações, histórias e jogos de papéis para ensaiar atitudes de cuidado; modele comportamentos solidários e destaque verbalmente os gestos positivos das crianças. Envolver famílias e comunidade em projetos simples reforça a transferência das práticas para além da escola.
Avaliação e registro: Priorize observação formativa e registros descritivos: notas de campo, fotos de atividades, pequenos portfólios e relatos das próprias crianças. Use indicadores simples para acompanhar progressos (por exemplo: identifica emoções; compartilha brincadeira; oferece ajuda) e estabeleça metas incrementais respeitando ritmos individuais. A avaliação deve orientar intervenções pedagógicas e fortalecer a parceria com famílias, garantindo que as ações sejam adaptáveis a diferentes contextos e de baixo custo.
Organização do ambiente e rotina
A organização do ambiente e uma rotina previsível são fundamentais para que crianças do Ensino Infantil desenvolvam atitudes de cuidado e solidariedade. Um espaço bem estruturado favorece interações positivas, redução de conflitos e autonomia; quando as crianças sabem onde encontrar materiais e quais são as expectativas em cada momento, ficam mais seguras para oferecer ajuda e dividir recursos. A rotina, por sua vez, cria um ritmo que permite oportunidades reiteradas para praticar gestos solidários, como esperar a vez, observar colegas e oferecer apoio nas pequenas tarefas.
Na organização física, privilegie áreas definidas e materiais acessíveis: prateleiras baixas, caixas etiquetadas e cantos com propostas claras (leitura, construção, dramatização, cuidados). Inclua um espaço acolhedor — um “canto do abraço” ou poltronas — onde as crianças possam se recompor e aprender a regular as emoções com suporte do adulto. Materiais de uso coletivo, como jogos e instrumentos, devem ser dispostos para facilitar o revezamento e o cuidado compartilhado, com sinalizações visuais que indiquem como guardar e conservar os objetos.
Rotinas claras e visuais ajudam na antecipação e reduzem a ansiedade nas transições. Use quadros com imagens, sequência de atividades e canções para marcar entradas, refeições, higiene e retornos. Estabeleça rituais coletivos curtos — acolhida em roda, classificação dos brinquedos, tarefa de pequeno ajudante do dia — que envolvam responsabilidades e promovam o respeito mútuo. Alternar momentos de trabalho livre e atividades orientadas garante espaço para a cooperação espontânea e para mediações docentes que reforcem comportamentos solidários.
Por fim, articule a organização do espaço e a rotina com a escuta das crianças e a participação das famílias. Observe e registre como os arranjos impactam as interações e esteja disposto a ajustar horários e materiais segundo necessidades reais. Proponha pequenas intervenções formativas, como conversas coletivas sobre regras de cuidado, oficinas de conserto de brinquedos ou projetos colaborativos, para transformar o ambiente em um campo contínuo de ensino e aprendizagem das atitudes de cuidado e solidariedade.
Sequências didáticas e atividades práticas
Estrutura da sequência didática. Uma sequência curta para trabalhar cuidado e solidariedade pode ser organizada em quatro momentos: problematização (observação de situações reais ou imagens que provoquem curiosidade), exploração (atividades dirigidas para vivenciar o cuidado), ação coletiva (tarefas colaborativas no espaço escolar) e reflexão (rodas de conversa e registro). Cada momento deve ter objetivos claros relacionados à competência EI02EO01, tempo delimitado (15–40 minutos) e estratégias de mediação do docente que favoreçam escuta, respeito e colaboração entre crianças.
Atividades práticas sugeridas. Proponha pequenas ações que integrem o cotidiano da turma: contação de história seguida de dramatização para exercitar empatia; criação de uma “caixinha de gentilezas” com tarefas simples para as duplas realizarem ao longo da semana; plantio coletivo em vasinhos para trabalhar cuidado com seres vivos; rodízio de responsabilidades (regar, organizar brinquedos) acompanhado de registro em desenho. Cada atividade deve prever papéis claros, materiais de baixo custo e momentos de orientação pelo professor para que as crianças compreendam a lógica do cuidado.
Registro e avaliação formativa. Valorize registros diversos: notas de observação, fotos, desenhos das crianças e autoavaliações simples (gestos, desenhos ou frases ditas). Use esses registros para planejar os próximos encontros e para dialogar com famílias, mostrando avanços e desafios na demonstração de atitudes solidárias. A avaliação aqui é processual, centrada em evidências de interação e mudança de atitude, não apenas em produtos finais.
Adaptação e sustentabilidade. As sequências podem ser ampliadas ou condensadas conforme a rotina da escola e as necessidades da turma, durando de uma a três semanas. Privilegie materiais recicláveis e atividades que envolvam a comunidade (visita a um jardim comunitário, participação dos familiares em uma roda). Para crianças com necessidades específicas, adapte papéis e tempo de atividade, garantindo acessibilidade sensorial e comunicativa, e mantenha registro das adaptações para orientar futuras práticas.
Mediação docente e linguagem
A mediação docente é um elemento central para o desenvolvimento da linguagem e para a construção de atitudes de cuidado e solidariedade no Ensino Infantil. Ao intervir nas interações cotidianas, o professor não apenas transmite vocabulário e estruturas linguísticas, mas também modela formas de escuta, empatia e resposta respeitosa. Uma mediação intencional favorece que as crianças reconheçam e nomeiem sentimentos, expressem necessidades e aprendam a responder ao outro de modo cooperativo.
Na prática, estratégias simples amplificam o efeito da mediação: uso de perguntas abertas, reformulações que expandem a fala da criança, repetição de enunciados com pequenos acréscimos e leitura compartilhada orientada pelo diálogo. O professor pode promover turnos de fala, encorajar a aproximação entre pares e intervir para mediar conflitos com linguagem que favoreça a resolução conjunta. Tais ações fortalecem tanto as competências comunicativas quanto as disposições solidárias.
Organizar o ambiente e a rotina com propostas linguístico-afetivas potencializa a mediação: cantos de leitura com materiais diversificados, murais com registros de vivências, referências visuais para apoiar a expressão e momentos regulares de roda que valorizem a escuta. A inclusão de diferentes línguas e modos de expressão (gestos, desenhos, dramatizações) reconhece as histórias das famílias e promove respeito mútuo, ampliando o sentido de comunidade dentro da turma.
Para orientar o registro e a avaliação formativa, o professor pode adotar observações descritivas, pequenos portfólios com produções e relatos e protocolos que verifiquem avanços na interação e na resolução colaborativa de problemas. Envolver famílias em trocas sobre as práticas de mediação e documentar exemplos concretos de cuidado e solidariedade sustentam a continuidade entre escola e casa, tornando a linguagem um veículo para relações mais empáticas e cooperativas.
Avaliação, registro e acompanhamento
Avaliação formativa no Ensino Infantil deve priorizar a observação contínua das interações e das atitudes de cuidado e solidariedade. Em vez de provas e notas, o professor registra episódios significativos — pequenas ações de ajuda, partilha e empatia — que revelam como a criança reconhece e responde às necessidades dos colegas. Esses registros orientam intervenções pedagógicas rápidas e sensíveis ao ritmo de cada criança, promovendo ajustes no cotidiano para favorecer comportamentos solidários.
Para registrar de forma prática, sugerimos um conjunto de instrumentos simples: anotações de campo (anecdóticas), listas de verificação de comportamentos-alvo, registros fotográficos e portfólios com trabalhos e relatos. Cada registro deve apontar o contexto, a ação observada e uma breve interpretação do mediador. Modelos curtos e padronizados ajudam a equipe a manter consistência e a recuperar evidências para planejar atividades que reforcem atitudes de cuidado.
O acompanhamento deve transformar registros em planejamento: analise padrões ao longo do tempo, identifique oportunidades de intervenção coletiva e individual, e estabeleça pequenos objetivos para as turmas e para cada criança. Utilize os relatos para construir sequências de mediação que envolvam dramatizações, rodas de conversa e jogos cooperativos, avaliando continuamente se as estratégias estão ampliando a capacidade de agir com solidariedade.
Finalmente, integre famílias e comunidade nesse processo. Compartilhe registros de modo respeitoso e confidencial, convide responsáveis para observações, reuniões curtas e co-construção de metas. Comunicações simples — fotos comentadas, bilhetes pedagógicos e encontros periódicos — fortalecem a continuidade entre casa e escola e ampliam os efeitos das ações educativas voltadas para o cuidado e a solidariedade.
Recursos, parcerias e materiais
Recursos, parcerias e materiais são pilares para viabilizar práticas de cuidado e solidariedade no Ensino Infantil: quando a escola mapeia materiais locais e ativa redes de apoio, amplia possibilidades pedagógicas sem depender de alto investimento. É importante priorizar itens abertos, reutilizáveis e sensoriais que incentivem a exploração coletiva, o trabalho em grupo e a cooperação entre crianças, respeitando as faixas etárias e as normas de segurança.
Na escolha de materiais, prefira alternativas de baixo custo e de fácil reposição: sucatas limpas (papelão, tampas, rolos), tecidos e botões para atividades táteis, elementos naturais (folhas, areia, sementes) e materiais didáticos simples para dramatização e construção. Materiais que permitam múltiplas utilizações e reinterpretações estimulam a criatividade e as trocas entre as crianças, reforçando atitudes solidárias ao compartilhar recursos e cuidar do acervo coletivo.
As parcerias expandem o alcance das ações escolares: envolva famílias em mutirões de coleta, convide organizações locais, bibliotecas, universidades e ateliês makers para oficinas e doações orientadas, e estabeleça protocolos claros de acolhimento e segurança. A formalização de parcerias com acordos simples, rodas de conversa e oficinas de formação para responsáveis e voluntários fortalece vínculos e cria um ambiente de corresponsabilidade entre escola e comunidade.
Por fim, organize o uso e a manutenção dos materiais com rotinas acessíveis às crianças — etiquetas, caixas rotuladas e momentos de cuidado coletivo — e registre práticas para avaliação formativa. Incentive o reaproveitamento e a sustentabilidade, promova rodízios entre turmas e documente resultados para ajustar parcerias e investimentos. Essas estratégias garantem que recursos e parcerias se tornem instrumentos duradouros para cultivar cuidado e solidariedade em sala de aula.